sábado, 15 de agosto de 2009

O TAUMATURGO NO ESPELHO DE ESCHER


Há 815 anos nasceu Fernando de Bulhões.

O Poeta se faz Vidente


ADUANA

senha e sonho e sanha com que esta palavra penetra no baile
máscara de maria-ninguém de fatura recente
ou será arca de ganas do tempo do rei
cadê o cabaço lacre de selada estampilha exigido por lei
cadela safada muamba curtida no bodum das galés
saturnália entrudo ostra grudada ao casco do navio
fidalga de tamanco sem nem um pingo acre de sangue azul real
verbete acessado de uma enciclopédia cibernética de gafes
vestes inconvenientes de quem não sabe com quem está falando
usa papel-carbono pra burlar alfândegas
chega sem passaporte sem convite sem o répondez s’il vous plait
cara de pau dribla a catraca do guichê da chefia do cerimonial
não exibe pendurado no peito atestado de salubridade pública
miss maxixe
embigada
corta-jaca que se insinua nos finos salões
palavra empenhada sem lastro de chão ou teto patrimonial
nem pé-de-meia tem
casca grossa não tem no cu o que periquito roa
hectares de terras que possui são as que carrega debaixo
das sujas unhas
heranças de nenhumas capitanias heriditárias
necas de pitibiribas de sobrenomes ilustres
topless e desnuda de sesmarias
de família ignorada do frio da pá ao pavio da foice e do sudário
pó de pau de anta
vassoura de bruxa
vírus viridiana da próxima epidemia mundial de gripe
vetada pelo código de barras do produtor e do consumidor
inhaca de marafona impudica
vira-lata da chinfra arraia-miúda da folia da grei
espojada se emprenhando ao vento vário na caçamba de camião
ou ao relento ralando as coxas nuelas no lombo neutro do sexo
da mula sem cabeça

(Waly SalomãoTarifa de Embarque – Editora Rocco, 2000. pp. 64/65.)

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

SOBRENATURALIA 2


Dando seguimento às narrativas sobre acontecimentos singulares, aproveito para compartilhar com os leitores deste "imblogrio" um fato sobrenatural presenciado por pessoas insuspeitas. A fenômeno se passou na Biblioteca Pública, mais precisamente nas dependências do Teatro Zaqueu de Melo, palco de memoráveis peças londrinenses, em especial as de Mario Bortolotto que fez do Zaqueu, durantes anos, a casa do grupo Cemitério de Automóveis. Segue abaixo um texto que fiz muito ligeiramente para a Folha Norte em 2008, narrando o que ouvi da boca do guardião daquele teatro, o o grande senhor Jesu.


O OBJETO SINISTRO DO TEATRO ZAQUEU DE MELO

Um dos casos sobrenaturais mais intrigantes de Londrina é o do objeto sinistro do Teatro Zaqueu de Melo. O acontecimento testemunhado por dois funcionários é absolutamente verídico, e até hoje desafia a inteligência de especialistas em fenômenos paranormais que não encontraram uma explicação para o que aconteceu naquela noite da década de 80.
Os funcionários se encontravam na Biblioteca Pública, prédio ao qual o teatro é conjugado. Um deles era o guarda. O outro, o responsável técnico do Teatro Zaqueu de Melo que ficara trabalhando até mais tarde. Os funcionários já tinham apagado as luzes das salas da biblioteca. Somente as mudas estantes de livros lhes faziam companhia. O funcionário do teatro foi ao encontro do vigia para trocar um dedo de prosa e assim ficaram descontraídos durante alguns minutos. Somente as vozes dos dois ecoavam na sala principal da Biblioteca.
Eis senão quando os dois ouvem um som em alto volume, o estrondo horrível de um objeto metálico, como se uma bola de ferro viesse repicando pelos degraus da escada do teatro Zaqueu de Melo. Ainda sem saber do que se tratava, e temendo que o tal objeto pudesse causar algum dano material ao prédio público, os dois funcionários correram imediatamente em direção à escada.
Quando chegaram lá acenderam as luzes e não encontraram absolutamente nada. Subiram e desceram as escadas e nada encontraram. Não acreditavam que um som tremendo daqueles não tivesse causa. Onde estava o objeto esférico metálico?
A única suposição aventada é que antigamente o Teatro Zaqueu de Melo era o Tribunal do Júri do Fórum de Londrina, local onde muitos assassinos foram condenados, e os fantasmas dos justiçados e injustiçados perambulavam com suas roupas manchadas de sangue.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

LOUCOS DE CARA

Sempre acordo com alguma música na cabeça, e essa manhã de frio súbito me trouxe à mente a bela interpretação que ouvi do amigo multi-instrumentista Marcos Scolari segunda feira passada, quando nos encontramos na casa de Bernardo Pellegrini. Marquinhos me emocionou com a canção "Loucos de Cara" de Kleiton Ramil, gravada por seu irmão, Vitor Ramil no LP "Tango". Deixo aqui - nesse post veloz - os versos e a uma versão do proprio Vitor, dessa obra-prima da canção gaúcha. E que bela sensibilidade essa família tem. Me fez pensar que a música brasileira fora do eixo hegemônico deve muito a duas delas: os Espíndola no Mato Grosso e os Ramil nos Rio Grande. Bem, elocubrações à parte curtam aí e depois me falem alguma coisa.

Loucos de Cara


Vem anda comigo pelo planeta
Vamos sumir!
Vem nada nos prende
Ombro no ombro
Vamos sumir!
Não importa que Deus jogue pesadas moedas do céu
Vire sacolas de lixo
pelo caminho
Se na praça em moscou
Lênin caminha e procura por ti
Sob o luar do oriente
Fica na tua
Não importam vitórias
Grandes derrotas, bilhões de fuzis
Aço e perfume dos mísseis nos teus sapatos
Os chineses e os negros
Lotam navios e decoram canções
Fumam haxixe na esquina
Fica na tua
Vem anda comigo pelo planeta
Vamos sumir!
Vem nada nos prende
Ombro no ombro
Vamos sumir!
Não importa
Que Lennon arme no inferno a polícia civil
Mostre as orelhas de burro
aos peruanos
Garibaldi delira
Puxa no campo um provável navio
Grita no mar farroupilha
Fica na tua
Não importa que os vikings queimem as fábricas do cone sul
Virem barris de bebidas no Rio da Prata
M'boitatá nos espera
Na encruzilhada da noite sem luz
Com sua fome encantada
Fica na tua
Poetas loucos de cara
Soldados loucos de cara
Malditos loucos de cara
Ah, vamos sumir!
Parceiros loucos de cara
Ciganos loucos de cara
Inquietos loucos de cara
Ah, vamos sumir!
Vem anda comigo pelo planeta
Vamos sumir!
Vem nada nos prende
Ombro no ombro
Vamos sumir!
Se um dia qualquer
Tudo pulsar num imenso vazio
Coisas saindo do nada
Indo pro nada
Se mais nada existir
Mesmo o que sempre chamamos real
E isso pra ti for tão claro
Que nem percebas
Se um dia qualquer
Ter lucidez for o mesmo que andar
E não notares que andas
O tempo inteiro
É sinal que valeu!
Pega carona no carro que vem
Se ele é azul, não importa
Fica na tua
Videntes loucos de cara
Descrentes loucos de cara
Pirados loucos de cara
Ah, vamos sumir!
Latinos, deuses, gênios, santos, podres
Ateus, imundos e limpos
Moleques loucos de cara
Ah, vamos sumir!
Gigantes, tolos, monges, monstros, sábios
Bardos, anjos rudes, cheios do saco
Fantasmas loucos de cara
Ah, vamos sumir!
Vem anda comigo pelo planeta
Vamos sumir!
Vem nada nos prende
Ombro no ombro
Vamos sumir!