segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

O INCÊNDIO DO TEATRO OURO VERDE

Cine-teatro Ouro Verde é destruído domingo passado. Foto Agencia DAMA. 

Há uma semana avistei da frente de casa uma grossa e negra coluna de fumaça que partia do centro de Londrina e tingia o céu. Moro longe do centro, por isso chamei a família para ver, me perguntando o que seria aquela coisa meio tipo 11 de setembro. Era por volta da 16 horas do dia 12-02-2012 (dia fatídico, pois foi quando a marquise de um anfiteatro da UEL desabou matando e ferindo pessoas). Poucos minutos recebo telefonema de Marcos Losnak me avisando: "O teatro Ouro Verde não existe mais." Triste notícia. O lugar de tantos acontecimentos da infância, adolescência, juventude e maturidade virara cinzas. Todas as pessoas sensíveis da cidade choraram essa perda histórica do antigo cinema projetado por Vilanova Artigas e Carlos Cascaldi e que foi inaugurado em 1952. Muitas coisas rolaram na lembrança: paixões cinematográficas, depois - quando transformado em teatro - paixões musicais, teatrais, amores, tantos beijos trocados no escuro. Do nosso querido teatro levarei a lembrança do último espetáculo que assisti ali: o belíssimo "Tio Vânia" de Tchekov, com o Grupo Galpão. Lembro-me de ter subido ao palco depois da apresentação junto com Marcos Losnak para abraçar os queridos amigos Eduardo Moreira e Antonio Edson. Saudades ficarão.
Mas o que aconteceu para chegarmos a esse desastre? Constatamos que fomos negligentes. O Ouro Verde passava boa parte do tempo em reformas, mas elas não foram suficientes. Estávamos a espera de uma nova casa de espetáculos, mas deixamos de lutar pela conservação deste patrimônio. Constatamos também que o Corpo de Bombeiros precisa de investimentos do Estado para que dê à população um mínimo de crédito de que a corporação poderá encarar um incêndio de grandes proporções e com pessoas envolvidas (por sorte o Ouro Verde estava vazio naquele dia). São alertas, grandes alertas para Universidade Estadual de Londrina e o governo do Estado do Paraná. 
De lamentável só a opinião de pessoas que não gostam da cidade, que falam coisas despropositadas sobre o que fazer com os escombros do velho cine-teatro. Mas convém esquecer isso agora e olhar ao nosso redor e ver em que pé anda a conservação de nossos raríssimos prédios históricos. Nesse sentido, é preciso que cuidemos de um outro prédio de Artigas e Cascaldi que está perecendo debaixo do nosso nariz: o prédio da Secretaria de Cultura, antiga Casa da Criança, prédio que é um exemplo da moderna arquitetura brasileira dos anos 50 - aliás, surpreendeu a muitos que os jornais locais se calassem a respeito desse atentado contra o patrimônio histórico de Londrina. 
Pois é, precisamos reconstruir o Ouro Verde? Sim, certamente, mas não podemos conservar a velha mentalidade esquecendo-nos de cuidar da conservação desse novo prédio. É uma questão de coerência. Esse incêndio do Ouro Verde é um sinal. Saibamos interpretá-lo. 
  
Abaixo meu depoimento à Folha de Londrina em 15/02 sobre essa tragédia:


''A cidade perde o seu grande templo cultural. Apesar de todas as críticas feitas ao Ouro Verde - boa parte delas procedentes, porque ele não foi construído como um teatro - o local foi palco de muitas jornadas, muitas apresentações marcantes na história da cidade. Desde quando era moleque eu frequentava o Ouro Verde. A minha escola, o Vicente Rijo, levava a gente lá para assistir a filmes. Tive a honra de tocar música naquele palco, participando de festivais. Depois, participei de teatro com o grupo Delta. Depois espetáculos da Escola de Teatro e do Armazém. Recentemente, até meu filho cantou ali em um coral, de uma forma que a minha família tem uma relação emocional muito forte com a história do Ouro Verde.
Acho que a questão é que, arquitetonicamente, o teatro é a secção de uma curva, um círculo, é a forma ancestral de apresentação dos homens. Acima de tudo, um teatro é um lugar onde as pessoas vão para se ver, para experimentar emoções coletivamente. Nós perdemos mais que apenas um espaço, perdemos um local onde nos reconhecemos, coletivamente, como sociedade londrinense. Quando você está assistindo a um espetáculo, você está rindo ou chorando coletivamente. Nunca é algo individual. É a comunidade que está rindo, é um grupo de pessoas que está se emocionando, que está vivenciando emoções em conjunto. Neste sentido, um teatro é um lugar essencialmente político.
Mesmo sendo uma perda irreparável, o que a gente espera agora é que exista um esforço político para a reconstrução do teatro. Aquele espaço, onde Ouro Verde estava, é onde estava localizada a antiga Companhia de Terras, é onde a cidade foi dividida, onde distribuíram lotes e terrenos. É curiosa essa vocação de Londrina: onde o ingleses chegaram para vender terras, para formar a cidade, nós erguemos um teatro.''

Maurício Arruda Mendonça, dramaturgo


1 Comentários:

Às 21 de fevereiro de 2012 às 11:51 , Blogger Danilo Dias disse...

Lamentável perda! Olhando a fumaça na foto, fico a devanear vistas de espctros dos que por ali já passaram e já se foram a ir rumo ao céu.

 

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